Crítica musical: Now and Then, a última canção dos Beatles

No final da década de 1970, John Lennon gravou "Now and Then" em sua casa, na cidade de Nova York. Trata-se de uma canção que ele havia escrito na mesma época. O compositor não a finalizou. Em 1995, os Beatles restantes tentaram concluir, mas o projeto não deu certo. Quase três décadas depois, a conclusão foi possível graças também à valiosa contribuição de sofisticadas tecnologias digitais, como a Inteligência Artificial, que melhoraram a qualidade do som da gravação, entre outras coisas.

Em 1977, Lennon anunciou que iria priorizar a família (seu filho, Sean Lennon, nasceu em 1975), o que significaria que a carreira de músico ficaria em segundo plano ou até mesmo seria deixada de lado. Esse contexto deve ser considerado. 

A canção foi gravada num período em que o "Lennon músico" estava de hiato, que só veio se encerrar em 1980. Então, ao compor e gravar essa canção no intervalo de sua carreira, o que ele pretendia? Havia a intenção de mostrar ao público ou de incluir em alguma coletânea dos Beatles?

Em "Now and Then" (versão de Lennon), os versos "I don't wanna lose you, oh no, no/ Abuse you or confuse you", por exemplo, manifestam o anseio do eu lírico possivelmente apaixonado que teme perder a pessoa querida. O som do piano é  taciturno. O aspecto romântico está em consonância com o Lennon dos anos 1970, década em que ele compôs e cantou diversas músicas de amor. 

"Now and Then" (versão dos Beatles) é um tanto distinta da versão de Lennon (os versos citados antes não estão presentes), mas a angústia do eu lírico de Lennon ainda é conspícua. A escala menor permite que a melodia possua um tom melancólico.

Talvez seja por isso que a música não me arrebatou como a maioria das canções dos Beatles. Talvez eu esperasse algo semelhante ao que os Beatles produziram na década de 1960. Mas o Lennon de "Now and Then" é o Lennon pós-Beatles. E a parceria Lennon-McCartney que aparece nessa nova música foi artificialmente possível graças à IA. 

A tecnologia permitiu uma nova e última música dos Beatles, porém nunca poderá reproduzir ou tornar possível a magia criada quando músicos brilhantes se sentavam, escreviam e cantavam canções juntos. 

O que não quer dizer que a música seja ruim. Muito pelo contrário. É bela, agradável e comovente. Todavia, o fã pode ficar com a sensação de "esperava mais" caso compare a obra com as músicas do apogeu dos Beatles.

Roni Pereira, jornalista residente em Salvador/BA

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